lembrete


Ana atirava milho às galinhas no quintal
A saboneteira tinha o tom do inverno
a água o tom da solidão,
caía da caixa nas pedras esponjosas  
seguindo caminho até a bica minguante
Os vales por que seguiam as águas rendiam pontes e personagens
aos meninos de Ana. O quintal tomava forma de metrópole
pés de manga serviam de aeronave para a invenção dos meninos
podia-se ver o mundo inteiro sobre as folhas que divisavam cada cabine
daquele pé de manga roxa que abrigava tudo quanto é periquito.
Tudo era tranquilo em redor de Ana. No curral, o rádio tocava “emoções”.

Os meninos se reuniam ao final das tardes de domingo para jogar bandeirinha
o pasto inteiro servia de campo. corria-se descalço até o dedo
encontrar alguma pedra infrequentável e destampar-se.
Quando a noite chegava, estrelas serviam de palco para que corujas e urutaus
pusessem em cena aquele medo melancólico sobre a nossa casinha de adobe  
a caixa derramando água e imitando a chuva por detrás
debaixo da saboneteira o gado todo ajuntado
como num encontro previamente marcado
mastigando a noite infinitamente
Tudo seria mais tranquilo se Ana não se afligisse tanto com(o) a noite.


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